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Lawand/Cid: já não se fazem mais oficiais como antigamente…

Por Ernesto Marques

“P” da vida com o perigoso Prigozhin e seus 25 mil mercenários do temido Grupo Wagner, até Putin admitiu: são bons soldados. Diga-se o mesmo do coronel Jean Lawand Junior, o dedicado e disciplinado soldado bolsonarista, dadas todas as provas de bravura e lealdade ao seu mito presidente.

Camuflado de civil, depôs na CPMI do 8 de Janeiro. Abusou do direito de produzir provas contra ele mesmo. Seguindo o exemplo do mito, mentiu. Mentiu muito e sem falsos pudores. Negou obviedades escritas, irrefutáveis. Produziu bons cortes de vídeo para alimentar a matilha, mas sem outra serventia.

Perdeu acesso ao generalato e o direito a um pijama com algumas estrelas nos ombros, junto com a oportunidade de ficar calado, garantida pelo garantismo do STF. Ao fim e ao cabo, a autoimolação do soldado, quase ex-candidato a general do Exército de Caxias, resultará inútil até para livrar a cara do destinatário do seu clamor golpista. Muito sacrifício em desonra própria e alheia. Resultado pouco e efêmero. Mais um na fila dos descartados.

A referência de oficiais como Lawand e Mauro Cid é um “mau militar”, no dizer do general Ernesto Geisel, prócer da geração de tenentes de 1922, que deu um golpe armado em 1964, e governou o Brasil com algum norte estratégico e sentido de nação. Um “bunda-suja”, segundo contemporâneos do então tenente Bolsonaro, até ser expulso por planejar atentados a bomba em quartéis do que chamaria de “meu exército”, décadas depois.

A referência de militar para esses oficiais graduados, nos quais o Brasil investiu muito dinheiro em cursos, treinamentos e correspondentes adicionais que lhes engordam os soldos, caiu na política de T-10 – paraquedas militar quase sem navegabilidade. Supostamente, para defender os interesses da família militar. Mas, no tocante a isso daí, das quatro vezes em que não “fraquejou”, nenhum de seus varões seguiu carreira nas Forças Armadas.

A referência militar da dupla de coronel e tenente-coronel e outros oficiais mais e menos graduados, com os quais a Previdência está comprometida, fez fortuna no exercício de mandatos parlamentares investindo em imóveis comprados na bufunfa – em dinheiro vivo!

Dificilmente o coronel Lawand Junior verá o sol nascer quadrado por ter participado da urdidura de um golpe e por ter mentido perante o Congresso Nacional. A punição mais dura que se prevê, em defesa da integridade da imagem do Exército Brasileiro, seria a expulsão.

Simbolicamente, a expulsão por desonra é a morte para militares, e assim ele seria tratado. Simbolicamente, ele morre para o glorioso Exército Brasileiro. Simbolicamente. Mas graças à esposa, convertida nesta hipótese em viúva ficta, a família seguirá contando com pensão equivalente ao soldo de R$ 25 mil que ele recebe hoje. Viúva ficta, no jargão militar e na legislação em vigor, porque fictícia, pois ele não morreu, muito menos em combate, como a guerreiros é honroso morrer desde os vikings, ou antes deles.

Em se confirmando esta máxima punição, ele seguirá vivíssimo para o exército que o ex-presidente pode, por questão de “justissa” chamar de seu. E se escapar dessa pena, o mais provável é que o ex-candidato a general suba mais um degrau apenas quando passar à reserva com soldo equivalente a uma patente acima da atual.

Com uma bala no próprio peito, Getúlio feriu de morte o histórico golpismo militar, com o qual chegou à Presidência. Feriu, mas não matou. A geração de oficiais generais forjados no tenentismo tinha muito lastro intelectual e muito conhecimento de Brasil. Politicamente feridos, se reorganizaram nos quartéis e nas ruas, com apoio civil, para consumar o golpe, finalmente.

Não se poderia esperar da caserna, em intervalo tão curto, outra geração de “gênios da raça”, como Golbery e outros generais, como Lott, Bevilacqua, Castelo Branco e Geisel; brigadeiros como Moreira Lima e Francisco Teixeira; nem almirantes como Cândido Aragão e Araújo Suzano.

Para a geração de Lawand, Mauro Cid e outros por serem revelados no decorrer das investigações, a referência é outra. Isso os coloca ao lado de outros “parças”, não praças, como o famosíssimo Fabrício Queiroz e o condecorado capitão Adriano – temido até por quem ele já tinha matado, segundo dizem…

Chegar até aqui já foi suficiente atrevimento. Explicar o fenômeno está completamente fora do meu alcance. O que gritam as evidências, indícios e provas cotidianas é um fato: já não se formam mais oficiais como antigamente. Pior para o Brasil.

Bons soldados de exércitos e milícias privadas não servem a projetos e nação – ensina a História.

Ernesto Marques é jornalista e radialista


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