Por Josivaldo Dias
Um dos livros mais lido do economista Celso Furtado, escrito nos anos de 1970, “O mito do desenvolvimento econômico” em seu capítulo I, trata do fenômeno da industrialização dos países de economias desenvolvidas(centro) e suas relações com os países de economias em desenvolvimento(periferia), o que trataremos neste breve artigo.
Para falar o porque o título do livro, associando ao “mito”, Furtado afirma que “os mitos operam como faróis que iluminam o campo da percepção do cientista social, permitindo-lhe ter uma visão clara de certos problemas”( p. 13). Isso ajuda a entender como os cientistas sociais escrevem e porque escrevem sobre os diversos fenômenos, que neste caso é sobre o desenvolvimento estrutural do capitalismo industrial.
Um conjunto de informações do chamado “sistema econômico planetário” identificados na primeira metade dos anos 50 do século XX, mostra a evolução do modelo das economias industriais, como também a dependência da economia norte-americana de recursos não-renováveis produzidos em outras nações para a sua geração de riqueza.
Um alerta, sobre os avanços das civilizações no que se refere ao consumo desenfreado dos recursos naturais e a poluição do meio ambiente, do “mundo físico”, sem limite, pela atuação do modelo industrial para abastecer as necessidades vigentes, o autor faz, e acredita ser uma característica evidente do homem predatório, que age sem pensar nas consequências.
Furtado, falando ainda sobre a degradação dos recursos naturais e do meio ambiente, considera que não se pode ter ingenuidade de achar que o progresso tecnológico solucionaria o problema, pois ao contrário, os recursos e instrumentos para geração da própria tecnologia contribui para agravá-lo:
“Trata-se apenas de reconhecer que o que chamamos de criação de valor econômico tem como contrapartida processos irreversíveis do mundo físico, cuja consequências tratamos de ignorar. Convém não perder de vista que na civilização industrial o futuro está em grande parte condicionado por decisões que já foram tomadas no passado e/ou que estão sendo tomadas no presente em função de curto horizonte temporal” (FURTADO , p .18)
A evolução do modelo capitalista de produção no século XIX(segunda fase) com as transformações no que se diz respeito a acumulação de grande capital e o aumento do comércio internacional vão contribuir para o aumento da produtividade do trabalho, gerando excedente da produção, no qual ajudaria a financiar o consumo do setor privado e público (p. 21) . A origem deste modelo foi na primeira fase da revolução industrial na Inglaterra, em que Londres se transformou em centro internacional concentrador financeiro no mundo, onde a cidade modificou toda sua estrutura e marcou o avanço do capitalismo na época. Na segunda fase industrial, entre os anos 70 de século XIX até a primeira Guerra Mundial no século XX, a centralização do capital e as decisões continua fixas em alguns países, nos Estados Nacionais, porém a novidade foi surgimento das chamadas grandes empresas. Sendo que antes a referência era o proprietário individual, o dono do capital.
Com a crise do capitalismo da segunda fase, começa um processo de integração do capital. Os países com tendências pré-capitalista, produtores de matéria primas e com grandes extensões de terras começaram a receber imigrantes estrangeiros e sofrem mudanças em suas economias:
“Nos países em que as vantagens comparativas assumem a forma de especialização nas exportações de produtos primários (particularmente os produtos agrícolas) o excedente adicional assume a forma de um incremento das importações”( FURTADO, p. 25).
Para o autor os países que praticaram as exportações de produtos primários, a forma que encontraram de se inserirem nos processos indústrias foi através das demandas de bens finais de consumo. Essa explicação é importante para compreender como os países da periferia capitalista, agroexportadores, se tornaram dependente dos países centrais.
Até os anos 60, após a segunda Guerra Mundial findada em 1945, onde Furtado chamou de terceira fase do capitalismo industrial, o volume de capital das grandes empresas se concentram em países da Europa e Estado Unidos, sendo apenas algumas subsidiárias de empresas a se instalarem em outros países. A concentração de renda e elevado padrões de consumo nestes países podem ser considerados por estes fatores.
Somente após a segunda Guerra Mundial, portanto na terceira fase da revolução industrial, é que os países subdesenvolvidos começam a fazer parte da industrialização, pelo chamado modelo de “substituições das impostações”. Neste mesmo período surge nos países centrais a empresas de oligopólio, principalmente nos Estados Unidos. Essas empresas se expandem no plano internacional e influenciam diretamente nas economias dos outros países, de forma organizada e articulada politicamente. Um exemplo foi a chegada no Japão e na Europa Ocidental. “Criou-se, assim uma superestrutura política a nível muito alto, com a missão principal de desobstrui ali, onde os resíduos dos antigos Estados Nacionais persistiram em criar barreiras entre países”( p .35).
Vale destacar a influência do dólar, a qual surgiu como a principal moeda, com paridades fixas, deixando o ouro para trás, vendo assim os Estados Unidos a se alimentar de atividades econômicas cuja vantagens comparativas lhe ajudavam. Dai possibilitou por um tempo ter uma estrutura onde “as importações tenderiam a crescer mais fortemente do que as exportações”, nos países em crescimento como a Alemanha ( p. 41).
E os países periféricos? A relação histórica de subordinação do centro -periferia é bastante evidenciada por Furtado. A inserção de empresas subsidiárias nas últimas décadas do século XX dos centros capitalistas teve grandes efeitos negativos nos países da periferia – “as economias periféricas conhecem um processo de agravação das disparidades internas à medida que se industrializam guiadas pelas substituições de importações”(p. 43).
Furtado afirma que os novos produtos fabricados no centro do sistema capitalista favorecem o dinamismo destas economias e contribuem para aumento dos salários e do consumo das famílias, diferente das economias periféricas. Mas, ele identifica que as minorias da população presentes na periferia, com a renda média maior, imitam o estilo de vida da população dos países centrais.
Outro ponto levantado é com relação a mão de obra. Nos países periféricos ela é mais barata, por isso grandes empresas se instalam nestes países, com objetivo de ter mais capacidade competitiva, quando coloca os produtos no mercado. Um exemplo são as empresas que foram dos EUA para o México.
Os mercados internos dos países periféricos são obrigados a seguir paramentos das empresas globais. O intercambio da tecnologia contribuem para integração das encomias centrais, acelerando a integração internacional. Neste processo grandes empresas pressionam os governos e estabelecem mecanismo de controle estatal.
“O Estado, numa sociedade de classe e onde grupos concorrentes competem e quase sempre se dividem de alguma forma o poder, constitui uma instituição muito mais complexa, de objetivos menos definidos e cambiantes, portanto menos linear em sua evolução”, (FURTADO, p.56).
Com esta nova fase do capitalismo, a periferia passa a ter um papel relevante, pois as economias centrais serão “cada vez mais dependente de recursos naturais não-reprodutíveis por ela fornecidos, mas também porque as grandes empresas encontrarão na exploração de sua mão-de-obra barata um dos principais pontos de apoio para firma-se no conjunto do sistema” (p. 59).
Sobre a elevação dos salários, os países periféricos com maior evolução tecnológica e industrial tende segundo o autor, a melhorar ou a igualar os salários dos trabalhadores com os dos países centrais. A questão é de que, quem dita as regras dos preços das mercadorias e por conseguinte dos salários, são as grandes empresas.
A acumulação típica dos países centrais, vai tender a homogeneização de padrões de consumo no centro e nas economias periferias provoca sempre distanciamento entre uma minoria com maior poder econômico, da massa que possuem bem menos recursos(p. 68).
Para explicar o distanciamento e as possibilidades de melhoria de vida das populações entres nações de centro e as da periferia, Furtado vai para a estatística. Ele cita que na época que escreveu este livro a população mundial era de 2,5 bilhões, e destas 800 bilhões residiam em países do centro do sistema, sendo a maioria de 1,7 bilhão, na periferia. Assim há evidência de não ter perspectiva de mudanças do quadro nas próximas décadas, onde a massa da população dos países periféricos dificilmente chegará aos padrões de consumo dos países centrais, neste modelo de desenvolvimento do capitalismo( p. 70).
Nos países periféricos, Furtado chama atenção na época, que a minoria privilegiada não passa de 10 por cento da população. Ele diz que por tanto, o modelo de desenvolvimento posto, tende a exclusão, e a quantidade grande da população constituiu um peso para o sistema, ou seja, não é bom para a sobrevivência do capitalismo. Embora, não se pode ignorar em determinados países, que possa acontecer mudanças na estrutura do poder político a causar modificações para um novo processo de desenvolvimento( p. 73).
O autor conclui este primeiro capítulo afirmando de que o modelo capitalista industrial vigente é na sua essência excludente. Ele não abonda a hipótese de que uma ruptura deste modelo concentrador de acumulação de riquezas, destruidor dos recursos naturais e gerador de desigualdade, possa acontecer no futuro. Pois segundo ele, é impossível os pobres alcançar o padrão de vida dos povos ricos neste sistema.
Josivaldo Dias é Economista, Especialista em Planejamento de Cidades e estudante do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional e Urbano da UNIFACS.