Eduardo A. Estevam Santos | [email protected]
A história e a historiografia já demonstraram e reconheceram as múltiplas, continuas e moleculares resistências dos negros/as ao sistema escravista, a primeira identificou os conflitos e negociações, a segunda, os sentidos e as experiências subjacentes às narrativas dos escravizados.
O temor da “haitinização” do Brasil determinou os projetos de imigração e o fim do tráfico. Entre as décadas de 1860 e 1870 tornou-se bastante comum os crimes cometidos por escravizados contra seus senhores, administradores, feitores e respectivas famílias. A recusa do jangadeiro cearense a transportar escravos, a proliferação de centros, associações e caixas de emancipação escrava, as lutas individuais e coletivas dos abolicionistas, principalmente dos abolicionistas negros (Luiz Gama, José do Patrocínio, André Rebouças, entre outros), constituíram-se num fluxo, numa potência micropolítica abolicionista fazendo com que o 13 de maio de 1888 não passasse de uma farsa.
Alguns meses depois de assinada a famigerada lei Áurea uma comissão formada por libertos do Vale do Paraíba denunciou publicamente que a legislação do fundo de emancipação de 1871 – que previa recursos do governo imperial e responsabilizava os proprietários de escravos – não havia sido cumprida, especialmente no caso da parcela do imposto a ser destinada à educação dos filhos dos libertos. Ao final da carta os libertos prenunciavam: “Para fugir do grande perigo que corremos por falta de instrução, vi-mos pedi-la educação para nossos filhos e para que eles não ergam mão assassina para abater aqueles que querem a República, que é liberdade, igualdade e fraternidade”.
Os negros/as encontravam-se completamente desterritorializados frente à sociedade concorrencial capitalista no contexto pós-abolição, tinham que agenciar suas ações políticas para que a exclusão, a discriminação e a seleção em nome da raça e do racismo não permanecessem ativos e estruturantes, uma vez que, jogados a própria sorte os negros/as estavam convencidos que não estariam em segurança se o inimigo vencesse, e esse inimigo não tem cessado de vencer.
Eduardo A. Estevam Santos é Doutor em História Social e professor da Unilab