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“Um líder: ou se respeita ou se mata”

Ouvidoria Geral do Estado Na foto: Yulo Oiticica, ouvidor geral do estado Foto: Alberto Coutinho/GOVBA

Por Yulo Oiticica

Com esta frase, de autoria do Cacique Rosivaldo Ferreira da Silva-Babau, quero me juntar aos que o conhece… Vem a pergunta, porque querem matar Babau? Porque tanta perseguição à um líder indígena? Você tem três opções; Você pode juntar-se a parte dos grande fazendeiros e de forma covarde, evitar o debate e rotula-lo de bandido. Você pode também dizer “não tenho nada com isso”, afinal Pilatos não foi o primeiro e você não será o último. Ou você pode conhecer a verdade. João Batista já dizia “Conhecereis a verdade, e ela vos libertará”.

Vamos a um pouco da verdade: retorno a pergunta, porque querem matar o cacique Babau? Conheço Babau há muito tempo. Este se destacou ainda muito jovem na defesa de seu povo, suas terras e tradições, de uma sabedoria destacada, sempre debatendo ideias sem abrir mão de seus ideais e convicções. De coragem e posição coerente, um vigilante da justiça à seus povos, mas capaz de tremer diante da injustiça a qualquer ser humano e em qualquer lugar no planeta. Mas porque querem matar Babau? Porque é mais fácil matar a verdade, do que enfrentá-la.

Os grandes meios de comunicação pregam todos os dias que o agro é tudo. Esquece de dizer que o agro é tudo que não presta, um modelo de economia que produz riqueza concentrando na mão de poucos, que gera pouco emprego, já que as máquinas cada dia mais substitui a mão de obra.

Um modelo de produção que em nome do produzir mais, consome os piores agrotóxicos/veneno do mundo e vai nos matando aos pouco. Um modelo que arrasa a agricultura familiar, destrói a pequena produção, essa que passa de pai para filho, que produz riqueza dividindo para muitos, que alimenta o corpo, sustenta a alma e constroem auto estima no povo do campo. O que tem Babau com isso? Tudo! Na Serra do Padeiro, solo sagrado onde vive Babau com seu povo Tupinambá, foi criado um círculo virtuoso na economia local, onde o governo levou uma casa de farinha (hoje tem seis) e produz a melhor farinha da região. Onde a cultura diversificada na produção, possibilita toda a alimentação consumida na aldeia e a venda de parte da produção, assim mantendo sua governança auto sustentável.

Imaginem embaixadores de oito países europeus, após uma visita e audiência pública na Serra(tratando das ameaças de morte a Babau e denunciando ao mundo), ao se depararem com as comidas deliciosas ainda se deslumbravam, lambiam os dedos ao comer de sobremesa o beiju de tapioca com geleia de cacau, e tudo produzido ali mesmo. De um lado eles perplexos com as delícias e do outro eu e a mãe de Babau rindo muito. Como bons baianos dizíamos em voz baixa: Nem lembravam de seus steak au poivre “Sabe de nada inocente” rsrs.

Brincadeiras á parte, se a TV mostrasse uma raiz de mandioca de um metro e oitenta, um maracujá que possibilita fazer uma jarra de suco, a geleia de cacau ou a melhor farinha da região que se produz na agricultura familiar, e veneno zero, veria que o agro é ogro, e que a agricultura familiar é pop, é vida. Mas continuo, porque querem matar Babau? E a justiça onde aparece nisso? De que lado está? Isso mesmo, de que lado? Já que essa, em sua maior parte, já tirou a venda há muito tempo.

Babau foi preso a mando de um juiz federal. Como todo preso político ficou incomunicável nas carceragem da polícia federal. Na época, como deputado dos Direitos Humanos, fui impedido de visitá-lo. No dia seguinte fora enviado para um presídio de segurança máxima em Moçoró no Rio Grande do Norte.

O mesmo juiz revogou a prisão mais de trinta dias depois por falta de provas. Enquanto Babau ainda voltava para Bahia, foi surpreendido com outro mandado de prisão, agora por um juiz Estadual. Esse mesmo juiz revogou a prisão mais de trinta dias depois, também por ausência de provas. Seria engraçado se não fosse trágico. Como se não bastasse, Babau foi convidado pelo Papa Francisco para uma audiência em Roma. Alguns dias antes da viagem, apareceu variou mandados de prisão.

Pergunto: onde esses estavam? Já que tiramos o passaporte alguns dias antes na polícia federal? Como sempre, os mandados logo caíram após a data da audiência. A justiça é igual para todos nesse pais? Trágico. Aos que chamam índios de selvagens ou preguiçosos, os convido a conhecer a Serra do Padeiro, lugar de paz, onde o sagrado convive com o trabalho de um povo feliz. Onde os santos, encantos e axés interagem e formam uma só energia. Onde a fogueira nunca se apaga. Onde a vida, quando chega ao fim, a natureza a entrega a seu reino. Na serra, o índice de homicídios é zero, consumo de álcool ou qualquer droga é proibido vender, portar ou consumir.

O respeito aos mais velhos é sagrado. Violência contra mulher? Não existe na Serra. Isso é coisa para nós, dito civilizados das grandes metrópoles. O velho Raul Seixas os chamaria de uma comunidade alternativa; os Tupinambá chama de vida de Indio.

Será que agora você já sabe porque querem matar Babau? Além de desmascarar o capitalismo de consumo selvagem com simplicidade sofisticada que leva seu povo a uma vida digna, Babau comete o maior pecado diante dos poderosos: não se submete a sua covardia truculenta do dinheiro que compra quase tudo. Não abaixa a cabeça diante dos canhões, não pede a bênção ao senhor da casa grande.

“Se querem nos tirar de nossas terras, podem vim, não iremos sair. vamos fazer o que sempre fizemos, Vamos resistir, porque morrer é fácil, viver que para nós é difícil”. Com esta frase de Babau, denuncio: Por isso querem matar Babau, porque ele prefere molhar a terra com seu sangue e dali fazer brotar mais resistência, a prostrar-se diante da truculência dos poderosos. Vamos todos a Serra, vamos pintar nossos rostos de vermelho, vamos a guerra, se esta for o caminho para paz e justiça. Babau você não está só, estamos contigo!

Que venha os canhões que nossas lanças estarão a postos. Que as elites não confundam, ser pacifistas com ser covardes.

Yulo Oiticica é militante dos Direitos Humanos e ex-deputado estadual pelo PT da Bahia por 4 mandatos.


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